De acordo com Leahy (2003), a Terapia Cognitiva da depressão surge como uma estratégia na modificação de crenças e comportamentos os quais influenciam nos estados de humor do indivíduo. Sua aplicação é dividida em três modos de ação, o primeiro concentra seu foco nos pensamentos automáticos e esquemas causadores de depressão, o segundo foca o modo interpessoal de relacionamento do paciente e o terceiro permite a possibilidade de mudança de comportamentos como forma de melhor solucionar a situação problema.

A Terapia Cognitiva apresenta como vantagem, segundo Beck (1995), a promoção de participação ativa do sujeito em seu tratamento, o tornando apto a identificar suas distorções na percepção do mundo, no reconhecimento dos pensamentos negativos como forma de aquisição de pensamentos alternativos os quais se assemelham mais com o real, encontrar a ideia base da sustentação dos pensamentos desagradáveis e dos alternativos e realizar a reestruturação cognitiva propriamente, através da geração de pensamentos mais adequados e reais em relação ao contexto ou à situação. Para Leahy (2003), a TC se baseia na importância do pensamento relacionado ao real, na realidade do mundo e dos fatos. Dessa forma, este recurso promove no paciente a capacidade de distinguir crenças verdadeiras das não verdadeiras em relação aos fatos, bem como o auxilia a julgá-los de forma realista, atenuando idéias depressivas.

Em relação a aspectos comportamentais, segundo a teoria de Lewinsohn (1974), a aprendizagem social e o reforço positivo são responsáveis pelo princípio e pela perseveração dos estados depressivos, ou seja, a depressão decorre do fato do paciente experienciar a ausência ou diminuição do reforço do mundo exterior, há rebaixamento do reforço positivo e/ou há experiências aversivas em excesso, o sujeito passa a se retrair quando exposto a atividades positivas, havendo diminuição do reforçamento. Dessa forma, o terapeuta deve motivá-lo a desenvolver atividades de reforço bem como a realização de interações sociais. Tais estratégias devem ser executadas de modo flexível, estarem voltadas unicamente ao paciente com o intuito de o envolver e lhe proporcionar enfraquecimento dos sintomas.

Dentre as estratégias, de acordo com Lewinsohn (1975), há programação das atividades a serem cumpridas, o sujeito registra suas tarefas a cada hora ao longo dos dias. Tais registros devem ser feitos de acordo com a possibilidade, com o intuito de se evitar possíveis distorções provenientes do humor depressivo ou de prejuízos na memória. O agendamento é  utilizado para monitorar as atividades, é feito como possibilidade de se fazer correções ante à eventual visão distorcida do paciente ao pensar como está realizando a tarefa no momento e para se avaliar as programações por ele executadas relacionadas ao domínio e ao prazer. O processo de agendamento serve, portanto, para se programar fazeres prazerosos bem como produtivos e para a identificação de afetos muito positivos ou muito negativos quando na execução de tais fazeres, permite fazer um panorama do funcionamento do paciente. Sendo assim, o ato de agendar atividades é uma técnica utilizada para se fazer um planejamento de exercícios comportamentais e registro de resultados. Estando as tarefas já decididas, isto garante ao paciente administração sobre seu tempo, reconhecimento de seus esforços pelo fato de estar realizando as atividades e registro de suas ações verdadeiramente executadas. Esta técnica garante significativo apoio a indivíduos cujo tratamento seja farmacológico, pois permite apontar os efeitos colaterais da medicação bem como as tarefas realizadas e as possíveis variações nos sintomas. Conforme Beck et al (1979), este modo de intervir pode ilustrar a interface entre sintomas depressivos com a escassez de comportamentos positivos e, portanto, capacitar o indivíduo quanto à resolução de problemas através de estímulos comportamentais.

De acordo com Powell et al (2008), habilidades insuficientes podem ser reconhecidas como predispositoras no desenvolvimento da depressão, ou seja, diante de uma dificuldade em relacionamentos interpessoais, o indivíduo não manifestará resposta a um reforço positivo. Para Beck e demais pesquisadores, além da desvantagem do sujeito em relação ao reforço positivo, seus sintomas aumentam devido às avaliações cognitivas e conclusões falhas quanto a falta deste reforço. Segundo Sudak (2006), o paciente, através do terapeuta, pode detectar o quanto seu pensamento é distorcido e impreciso, causador de emoções e comportamentos disfuncionais. Este reconhecimento por parte do indivíduo permite um avanço em seu tratamento, conseguido tanto por meios cognitivos como comportamentais em direção à resolução do problema. 

Passos necessários para uma remodelação cognitiva

Para Beck (1995), nas seções de Terapia Cognitiva, o terapeuta capacitará o paciente a reconhecer as crenças disfuncionais, as distorções cognitivas comuns bem como os pensamentos automáticos, reações fisiológicas, emocionais e comportamentais resultantes dos pensamentos, possíveis comportamentos realizado no enfrentamento das crenças disfuncionais e como os fatos anteriores têm influenciado na permanência das crenças do paciente. Feito isto, uma vez comprovado reconhecimento pelo sujeito dos fatores desencadeadores do comportamento depressivo, fazer-se-ão sessões intermediárias com a utilização de técnicas que o possibilitem trabalhar seus sintomas.

A técnica de evocação de pensamentos e pressupostos consiste em despertar no paciente a identificação de seus pensamentos, bem como o modo como estes influenciam as emoções e comportamentos. Uma vez que o objetivo da TC no trato do Episódio Depressivo Maior é tornar o indivíduo ativo em seu próprio tratamento, as técnicas cognitivas devem ajudá-lo a atingir as metas da terapia e não lhe causarem dependência. Dessa forma, o sujeito deve ser motivado a combater seus episódios depressivos sem a necessidade da intervenção do terapeuta, pois isto o estimula a desenvolver habilidades de enfrentamento (Beck, 1979).

A explicação do processo pelo qual os pensamentos geram sentimentos é outra técnica na qual a pessoa é incentivada a identificar pensamentos e os sentimentos deles provenientes. Isto pode ser fonte de dificuldades para o paciente num primeiro momento, então o terapeuta irá ajudá-lo na execução desta técnica (Leahy, 2003).

Quanto ao registro de pensamentos disfuncionais, objetiva o sujeito a anotar num diário o evento experimentado e o pensamento gerado por este evento. Numa coluna adicional, são registradas notas referentes à intensidade como o paciente acredita que seus pensamentos sejam verdadeiros. Este procedimento permitirá ao indivíduo a identificar pensamentos automáticos disfuncionais. Em seguida, é pedido à pessoa reconhecer a emoção e sua intensidade, numa escala de 0 a 10 ou 0 a 100 (Beck, 1979). Quanto a marcação dos pensamentos, há necessidade de se fazer uma coluna de evidências e outra para despertar o pensamento alternativo relacionado ao contexto. Ao final o paciente é levado a quantificar o quanto o novo pensamento lhe desperta crédito, bem como o quão intensa é a emoção (Padesky e Greenberger, 1995).

Conforme Powell et al (2008), o registro de pensamentos com base no processo (RPBP) é feita por sete colunas, sendo elas: seta descendente (Burns, 1980), exame das evidências (Leahy, 2003), técnica do advogado de defesa ou ponto-contra-ponto (Freeman e DeWolf, 1992), seta ascendente (De-Oliveira,2007), desenvolvimento de esquemas mais positivos (Leahy, 2003) e o diário de afirmações positivas (Beck, 1995). O RPBP atua para desestruturar pensamentos negativos de pacientes deprimidos através da consciência de suas crenças nucleares em relação a si mesmos (autoacusações) e assim motivá-los a investirem em um processo mais construtivo, com o desenvolvimento de crenças nucleares mais positivas.

De acordo com Burns (1980), há situações nas quais o pensamento automático negativo se mostra verdadeiro no sujeito, ele se sente verdadeiramente rejeitado ou inapto para determinada função. Deve-se então identificar as crenças subjacentes potencializadoras do pensamento, elas deverão ser questionadas por meio do método socrático de questionamento, ou seja, aplicação da técnica da seta descendente. Tal procedimento permite à pessoa aquisição de um raciocínio autônomo, apto a questionar evidências e a criar avaliações alternativas. Ao despotencializar as crenças, há redução dos sentimentos de medo, desmotivação ou tristeza, o método da seta descendente é, portanto, muito eficaz no combate a crenças mantenedoras do quadro depressivo.

 Extensão do tratamento, diminuição dos sintomas e estratégias para evitar recaídas

Para Blenkiron (1999), mesmo havendo pacientes cujo tratamento com Terapia Cognitiva deva ser feito através de grande número de sessões, a prioridade do recurso terapêutico reside no fato da possibilidade de ser executado em curto prazo, com variação de 6 a 20 sessões.

As sessões, quando estruturadas, permitem ao sujeito desenvolver um senso de controle pessoal, com a aquisição de técnicas para se tornarem seus próprios terapeutas e consequentemente reduzirem seu tempo de terapia.

De acordo com Byrne e Rothschild (1998), indivíduos com transtornos de personalidade levam um tempo maior em terapia, até aproximadamente 12 meses. Quanto à tendência ao abandono do tratamento pelo paciente, o terapeuta deve se atentar ao processo de adesão deste paciente e evitar que a desistência aconteça, pois o sujeito, ao abrir mão precocemente de frequentar as sessões após haver melhora dos primeiros sintomas, estará propenso a retrocessos dos mesmos.

Ao nos referirmos às sessões finais de terapia, conforme Powell et al (2008), estas permitem um balanço dos ganhos obtidos pelo paciente, e a ênfase na importância da prevenção de recaídas. Uma vez que haja melhora dos sintomas, isto permite ao indivíduo enfrentar novas situações de perdas e se adaptar a possíveis situações-problema. É necessário, no processo de finalização da terapia bem como em seu início, destacar à pessoa a limitação de tempo do tratamento, deixar claro o fato do processo terapêutico estar relacionado com a identificação dos pensamentos, seus questionamentos e reestruturação assim como no aumento da autoconfiança por meio de eventuais ganhos obtidos por este paciente ao longo do tempo e capacitá-lo a exercer um papel ativo em sua própria cura. É importante o indivíduo estar habilitado a reagir quanto ao reaparecimento dos sintomas, uma vez que suas reincidências e implicações aumentam a possibilidade de recaídas. De acordo com Deckrsbach, Gershuny e Otto (2000), é necessária a aprendizagem do sujeito em se tornar seu próprio terapeuta, estando apto a enfrentar possível retorno dos sintomas, sendo este aprendizado evidenciado e enfatizado nas sessões finais.

Conforme Fava et al (1998), a reincidência de sintomas depressivos quando na administração por antidepressivos é fato comum e varia em uma taxa entre 9 e 57%. Deve-se então atentar para a eficácia da Terapia Cognitiva na prevenção da depressão recorrente em comparação à intervenção apenas farmacológica. Porém, tais autores reconhecem também a importância da associação do tratamento cognitivo com o investimento medicamentoso na redução das recaídas.

Segundo Powell et al (2008), em um estudo realizado na presença de 40 pacientes, os indivíduos com depressão maior reincidente tratados com sucesso por antidepressivos foram segregados em dois grupos, em um foi feita a aplicação de técnicas da Terapia Cognitiva dos sintomas residuais e em outro manejo clínico convencional. Ao final de 20 semanas de tratamento, em ambos os grupos, foi feita a interrupção do manejo de antidepressivos. No decorrer de dois anos, não foi feita nenhuma administração medicamentosa. Ao final do estudo, o grupo submetido a procedimentos cognitivos manifestou visível redução de sintomas residuais em comparação ao grupo assistido por tratamento clínico convencional. Em relação à taxa de recaída, a aplicação da Terapia Cognitiva atingiu apenas 25%, enquanto a recaída no grupo administrado por manejo clínico foi de 80%.

Houve um estudo cuja conclusão mostrou que os efeitos da Terapia Cognitiva alcançam até quatro anos, sofrendo posterior enfraquecimento. Porém, segundo Fava et al (1996), esta terapia cognitiva de sintomas recorrentes pode promover diminuição da frequência de episódios de depressão maior por longo período. Estes resultados questionam o fato de o tratamento farmacológico prolongado ser único quanto à prevenção de recaídas  em pacientes com depressão recorrente.

De acordo com Teasdale et al (2002), há possibilidade do paciente prever cognitivamente as recaídas através da “consciência metacognitiva”(CM), cujo processo permite ao invés de se modificarem as crenças disfuncionais, considerar os pensamentos e sentimentos negativos do Episódio Depressivo Maior como manifestações mentais e não como o expressar da realidade. Conforme haja a evolução do sujeito, surge nele a capacidade de se desprezar possíveis pensamentos negativos automáticos, hipótese esta que, apesar de permanecer em investigação, é aceita como base racional na explicação do sucesso promovido pela Terapia Cognitiva quanto a redução de recaídas.

Conclusão

Diante dos dados refletidos até então, pudemos reconhecer que a abordagem cognitiva no trato da depressão é a mais promissora no sentido de diminuir ou até mesmo eliminar os sintomas depressivos por meio de técnicas cuja principal ação é modificar pensamentos e crenças disfuncionais e excessivamente negativas no paciente, e o motivar a substituí-las por cognições alternativas mais reais e positivas em relação a visão de si mesmo, às situações vivenciadas, aos relacionamentos interpessoais e à visão de futuro. Tal recurso terapêutico, o qual poderá ser associado com antidepressivos como forma de potencializar seus benefícios, produzirá no indivíduo melhorias tanto nos aspectos comportamentais como emocionais, uma vez que o foco deste procedimento é a modificação de pensamentos e crenças distorcidas. Quanto à depressão maior, por acometer grande parcela da população mundial e ser a causa de considerável incapacitação, sua prevenção é de fundamental importância, com possibilidade de se associar, mais uma vez, o tratamento cognitivo ao farmacológico.

Autora: Psic. Laís Regina dos Santos