Como escrevi em um texto anterior, a primícia no atendimento de adolescentes é conhecer sobre sua fase desenvolvimental. Ao saber o que é esperado e o que não é para esse momento, torna-se possível ao profissional orientar sua intervenção. Para que haja engajamento do adolescente no trabalho terapêutico, é essencial que haja modificações e adaptações, as quais serão possíveis ao compreender as implicações e desafios dessa fase. É preciso ter em mente que nem sempre ao receber um adolescente no consultório, sua demanda trata de um transtorno especifico, podem estar em cena alguns aspectos marcantes desse período, como variação do humor, relevância dada aos pares, construção da nova identidade, distanciamento da família e comportamentos de risco. Como aponta a literatura, é provável que em nenhum outro momento da vida, as decepções com as amizades (gerando uma tristeza intensa), a necessidade de pertencer a um grupo e a preocupação acentuada com as amizades tenham tanta importância quanto nesse período desenvolvimental. De fato é um momento com grandes dilemas, desafios, não apenas percebidos pelos profissionais da saúde e pais, mas também pelos próprios adolescentes. Muito se fala dessa fase, mas nem sempre tem respaldo em pesquisas que abordam assertivamente as peculiaridades do adolescer. Inclusive pouco se tem de intervenções com evidencias científicas que atendam as demandas voltadas para a realidade dessa etapa. Como sabido, há uma grande divergência quanto a definição da faixa etária. É comum encontrar várias literaturas que agrupam infância e adolescência em um mesmo pacote. Basta conviver com um adolescente de 10 e outro de 15 anos para perceber notoriamente as diferenças entre eles, não apenas ao que diz respeito a cognição, que de acordo com Piaget, um estaria no estágio de operação concreta e o outro no estágio de operação formal que ocorre a partir dos 12 anos. As interações sociais também divergem, enquanto o de 15 busca mais independência nas suas conexões, o de 10, além de serem mais lúdicas e a preferência pelo mesmo sexo, também há maior dependência dos pais. Este movimento de autonomia e independência é a principal característica dessa fase, porém ainda não são completamente independentes, portanto suas tomadas de decisão e comportamentos estarão intrinsecamente influenciadas pelo sistema familiar. Na conduta terapêutica é indispensável a compreensão de como se dão as relações familiares, suas crenças subjacentes, como também se há condição de abuso e negligência. Além do âmbito familiar, a escola é outra fonte que deve ser considerada para colher informações importantes para o processo terapêutico, bem como para potencializar a eficácia do tratamento. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) ressalta as experiências sociais, o processo de aprendizagem no decorrer do desenvolvimento, assim como a forma do indivíduo processar as informações e as emoções experimentadas. A meta da terapia é ajudar o adolescente a manejar os desafios desse período e muni-lo com estratégias para tantas outras demandas que surgirão no decorrer da vida. Faz parte deste repertório de estratégias as habilidades para resolução de problemas. Na terapia cognitivo-comportamental (TCC), entende-se que uma intervenção eficaz é aquela que colaborativamente construirá e modificará para uma maneira mais adaptada, a forma que o paciente dá sentindo a vida, se comporta, pensa e sente. Um fator muito importante no processo terapêutico com adolescentes é que raramente eles vêm por conta própria, esse é um fator que pode por exemplo dificultar o vínculo. Para tal, é válido desde o primeiro contato oferecer um senso de controlabilidade do processo terapêutico e um ambiente agradável e acolhedor. É fundamental que o terapeuta seja empático, uma vez que, como já discorremos, é uma fase com muito estigmas inclusive pelo próprio adolescente. Portanto, ver o adolescente por meio das suas perspectivas, buscar compreender seu mundo e encontrar e pontuar aspectos próprios da sua fase de desenvolvimento, ajudam na condução do trabalho mesmo que a motivação de estar em terapia não tenha partido dele. 

Kendall (2011), citado no livro Terapia Cognitivo-comportamental para Adolescentes, de Neufeld e colaboradores, cita três características que o terapeuta deve ter, são: consultor, diagnosticista e educador. Segundo ele, assim como um treinador, o terapeuta deve fazer emergir o melhor das pessoas, por meio das oportunidades, feedbacks e apoio às demandas necessárias. Para atender esse público é preciso disposição genuína para embarcar em seu universo, se interessar por músicas, filmes, séries afim de conhecê-lo. Considerar que situações que são tidas pelos adultos como sem importância, para aquele adolescente é cheia de significados. As intervenções nos comportamentos opositivos típicos dessa fase, devem ser de por meio da validação dos pensamentos e emoções que trazem e em hipótese alguma de forma confrontativa ou autoritária. Os instrumentos, técnicas e estratégias terapêuticas objetivam o engajamento na terapia, facilita a comunicação e a compreensão do que deve ser trabalhado. O rapport e a colaboração com o paciente, é considerado essencial como conduta que deve receber empenho por parte do terapeuta. 

Lock (2005) no livro Terapia Cognitivo-comportamental para Adolescentes, de Neufeld e colaboradores, explicita que o terapeuta deve lançar mão da psicoeducação, com o objetivo de explicar todo o processo terapêutico. Outra técnica que esse autor cita é a de reestruturação cognitiva, a qual exige maior empenho para ajudar o adolescente a desenvolver uma nova perspectiva e usar novas alternativas. A linguagem precisa ser simples, de fácil entendimento para o paciente, uma maior flexibilização em relação a tarefa de casa também é necessária. Quando torna-se difícil trabalhar primeiramente pela via da reestruturação cognitiva, o foco deve ser comportamental, na busca da resolução dos problemas.  

Portanto, é esperado que o terapeuta cognitivo-comportamental desenvolva habilidades para engajar e criar aliança com o paciente para a construção de um trabalho colaborativo, que é um dos princípios dessa abordagem. Assim como também ter conhecimento suficiente dessa fase e da flexibilização de técnicas e instrumentos para um processo efetivo.


Um grande abraço,


Ana Paula Moreira

CRP 06/105482

Psicóloga – Crianças e Adolescentes  

Especialista em Terapia Cognitivo Comportamental 

Contato: 12-99231-3125


Referência Bibliográfica

NEUFELD, C. B. (Org.). Terapia cognitivo-comportamental para adolescentes: uma perspectiva transdiagnóstica e desenvolvimental. Porto Alegre: Artmed, 2017.